Artigo - Frei Moser

Eleições presidenciais 2010: pontos para reflexão

Sob muitos aspectos as eleições do último dia 3 de outubro revelaram uma  boa dose de maturidade do povo brasileiro. Não apenas compareceu em massa às urnas, como votou com tranquilidade naquelas pessoas que parecem merecer confiança, ou ao menos que podem ser portadoras de algum recado significativo.

Contudo, essas eleições, como já sucedeu em outras precedentes, levantam uma série de dúvidas sobre o papel exercido pelos denominados Institutos de Pesquisa. Bom seria se os entrevistados tivessem seus nomes revelados, para que ninguém possa levantar suspeitas de qualquer tipo.

Não deixa de ser notório que, à longa distância, os Institutos cheguem à conclusões bem diferentes daquelas reveladas nas vésperas dos fatos, ou também na chamada boca de urna. Como também não deixam de  pairar dúvidas sobre a clarividência de certos comentaristas que se julgam quase infalíveis em seus diagnósticos. Nem sempre as esperadas ondas surgem com as cores preditas.
    
Mas há outros ângulos que são importantes ser lembrados para que possamos  progredir em termos de cidadania. Um deles é o que recorda o que há  muito os cristãos já sabiam:  que Deus também fala através de acontecimentos que à primeira vista pouco têm a ver com seus desígnios divinos, ou com o bem estar do povo.  Este é o caso, por exemplo, de uma eleição. Para quem sabe ler entre as linhas Deus parece estar mandando alguns recados.

Assim, o primeiro recado da presente disputa eleitoral é muito claro para quem é iniciado na fé e conhece a tragédia que se abateu sobre os prepotentes egípcios na travessia do Mar Vermelho. Ou então basta recordar uma estrofe fundamental do Magnificat, hino profético atribuído a Maria, a mãe de Jesus para se tirar uma lição inesquecível. Nas duas passagens se evidencia que Deus não suporta os arrogantes. Derruba os poderosos de seus tronos e os afoga nas águas do mar com todo o seu aparato de guerra. Por aí se vê que os que querem extirpar da face da terra os que  julgam serem inimigos acabam eles se auto extirpando.
    
Os recados de Deus são por vezes contraditórios. Por um lado mostram que, sob alguns aspectos, o povo sabe discernir entre valores e desvalores. O povo não deposita sua confiança em quem, ainda que de maneira maquiavélica e cibelina, ou seja, em envelope fechado, apresenta propostas inaceitáveis não só para cristãos, como igualmente para todas as pessoas de bom senso. Por outro lado, se evidencia que por vezes o povo não sabe distinguir o joio do trigo, e acaba colhendo tiririca, ou até mesmo acaba fazendo uma confusão de gênero e colhendo fichas sujas como se fossem limpas.

Da mesma forma, se faz difícil entender como representantes das mais altas instâncias dos poderes se esqueçam de sua missão primeira, que é a de manter a imparcialidade, e com isso evitar qualquer suspeita sobre abuso de poder. Mas, esta mesma contradição é apenas aparente, pois para bom entendedor, no caso o próprio povo, quem mistura funções com interesses de classe ou ideologias acaba caindo nas armadilhas que preparou para os outros.

Enfim, pode-se concluir de antemão que um segundo turno não se transformará apenas numa espécie de ritual de agonia para uns e de comemorações vitoriosas para outros. O que se espera é que mostrando maior maturidade ainda o povo se negue a aceitar pacotes fechados e a referendar passos de quem não tem nenhuma experiência no campo político e administrativo. Arriscar no desconhecido é como mergulhar no abismo do que se denomina de buraco negro. O bom senso aconselha que, mesmo que não apareça no céu nenhuma estrela fulgurante, fixe seus olhos naquelas que tem uma trajetória conhecida.


Frei Antônio Moser é Diretor Presidente da Editora Vozes, professor de Teologia Moral e Bioética no Instituto Teológico Franciscano (ITF) em Petrópolis (RJ), membro do Conselho Administrativo da Diocese de Petrópolis, Pároco da Igreja de Santa Clara, membro da Comissão de Bioética da CNBB, Coordenador do Comitê de Pesquisa em Ética da Universidade Católica de Petrópolis (UCP), além de conferencista no Brasil e no exterior. Escreveu 25 livros e inúmeros artigos científicos para revistas nacionais e internacionais. Além disso, desenvolve intensa atividade pastoral, sendo um dos grandes especialistas brasileiros em Pastoral Familiar e Bioética.

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